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sexta-feira, junho 27, 2025

Robert De Niro - A ‘máquina’ da destruição

 (O GLOBO - sexta-feira, 6 de março de 1992.)



Indicado para o Oscar, Robert De Niro diz ao GLOBO que é

A ‘máquina’ da destruição

ANA MARIA BAHIANA
Correspondente

LOS ANGELES – Indicado para o Oscar de melhor ator por seu desempenho como o psicopata Max Cady — interpretado pela primeira vez por Robert Mitchum na versão original de “Cabo do Medo”, de 1962 — Robert De Niro já está às voltas com outro projeto: as filmagens de “Night and the City”, em Washington. Mas está tranquilo. E até a Academia, que já o indicou algumas vezes, “ainda fui indicado este ano, alguma coisa estou fazendo direito”, diz, sorrindo.

Sobre o diabólico Max, o ator comenta: “ele não foi mais difícil que qualquer outro papel que eu tenha feito. Na verdade, foi mais difícil me afastar do papel de Travis, de “Taxi Driver”, que Martin Scorsese fazia durante as filmagens.” E ao lembrar seu personagem em “Cabo do Medo”, Robert De Niro conta ao GLOBO por que resolveu se dedicar também à atividade de produtor.


O GLOBO – Scorsese diz que foi o senhor quem o convenceu a realizar “Cabo do Medo”. O que o fez se apaixonar por esse projeto?
ROBERT DE NIRO – Não sei se apaixonar seria o termo, mas eu estava convencido quanto ao projeto. Vi o filme original na escola. Foi uma ótima história, uma ótima impressão. Especialmente Robert Mitchum. A música também me impressionou bastante. Então, quando li o roteiro, fiquei encantado. Ia poder fazer um papel sensacional. Eu o achei profundamente cinematográfico. Quando Scorsese entrou no projeto, o filme cresceu ainda mais. Com ele, você sabe, vai poder fazer algo sensacional.


O GLOBO – Como o senhor vê seu personagem, Max Cady? Ele seria uma espécie de “Exterminador do Futuro”?
DE NIRO – Não posso partir de uma censura ao personagem quando estou trabalhando na sua criação. Tenho que procurar entendê-lo, compreender suas motivações. Para mim, Max Cady é essencialmente um homem muito inteligente, esperto, e obcecado por uma ideia. Vi e revi tudo na vida dele, e a partir dessa ideia, nada mais o desconsola, nada mais o segura — suas limitações humanas, sua busca de senso-humor, etc. Tudo isso é devorado por essa ideia de vingança e destruição, como a máquina de exterminador do futuro?


O GLOBO – Mas o senhor não percebe qualquer alteração na sua vida pessoal depois de passar horas repetindo atos tão violentos como os de Max Cady?
DE NIRO – Não, pelo contrário, me sinto mais calmo. Eu me sinto exausto. E isso é bom sinal. Percebi isso claramente lutando em “Touro Indomável”. Pensava que deveria me acalmar depois de filmar. Toda a agressividade fica na cena, e eu vou para casa e durmo, exausto.


O GLOBO – Personagens intensos são uma constante em sua carreira. O que eles têm de especial?
DE NIRO – Eles são mais intensos. Alguns são até mais difíceis de fazer. São mais complexos, mais realistas... Os personagens muito leves não têm a ver com a vida como ela é. Mas os mais intensos se aproximam muito mais do que eu vejo e ouço todos os dias. Eles me fazem pensar sobre o mais realista possível, mesmo que estejam presos numa fantasia da tela. Vida e emoção estão na tela, não fora dela.


O GLOBO – Como é conviver com a violência e a crueldade de um personagem assim?
DE NIRO – Não levo isso para casa, se é o que você quer saber. Sempre tive uma fronteira muito clara na minha cabeça entre o que sou eu e o que faço. Algumas vezes até demais, coisa de ficar sem falar, andar. Coisas do comportamento. Mas é só isso. É o preço que se paga por se dar 100% em cada dia de filmagem.


O GLOBO – Além de ator, o senhor agora é produtor, com a sua companhia, a Tribeca.
DE NIRO – O que me interessa, agora, é estar envolvido com o filme desde a origem, ter uma ideia desde a origem e acompanhar o que for necessário para que essa ideia sobreviva e chegue com força até o produto final. Não se pode só ser ator. E se quiserem que você faça, você tem que saber fazer, não?

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