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quinta-feira, junho 12, 2025

Antonio Houaiss e a cerveja

 **Houaiss e a Cerveja**  

*Danusia Barbara*  



O papo de cerveja é comprido, erudito ("o Pepeu do Goitacá encaçapou 18 penaldis só em 1953"), sempre relevante para a história da nação e cheio de discussões acaloradas — ou estupidamente geladas, dependendo do chope. Pois agora, além dos tiragostos de sempre — as batatinhas, os torresmos, o provolone à milanesa, os remédios para o fígado —, o bebedor sério arranjou mais um tempero para o papo: um livro escrito por um imortal da Academia, só sobre a loura.  

Livrinho aliás vistoso, bem editado, com ilustrações sugestivas e informações preciosas para gastar na mesa do chope, naquela hora de crepúsculo cervejal, onde a língua começa a arrastar e a questão etimológica passa a ser importante. Quem, senão mestre Antonio Houaiss, desencavaria que a palavra *bebida*, com a repetição do *b*, marca, nos lábios, algo que é quase imitativo do ato mesmo de ingerir líquido?  

Mas o tradutor de James Joyce não para por aí. Estudando o latim *cervísia* ou *cerevisia*, fala de *zythum* no Egito, vai ao italiano *cerevisia* (suplantado por *birra*), explica o velho alto alemão *bior*, o médio holandês e holandês moderno *bier* e diz que a primeira documentação do espanhol *cerveza* é de 1481, embora, assim como o português *cerveja*, devesse ter "curso oral bem anterior".  

Antonio Houaiss gosta de beber cerveja e não fica só nas erudições filológicas:  

— *Adoro a cerveja pelo que ela tem de socializante, de exotérico (com x, porque esotérico com s é adjetivo para a libação com vinho) e de natural. Não há namoro que, depois de vários copos de cerveja, não possa ser interrompido para se fazer pipi. Quer coisa mais bonita que isto?*  

Enquanto luta corpo a corpo para fazer o maior dicionário da língua portuguesa ("será três vezes maior que os existentes até hoje"), Antonio Houaiss encontrou "uns quinze dias" para fazer o livro, a convite do editor Geraldo Jordão Pereira. Já tinha os dados, foi questão de redigi-los.  

O livro fala da história da cerveja, seus componentes, dá números e fatos curiosos, estuda diversas marcas por todo o mundo e ainda fornece receitas, como salada de cerveja, sopa de cerveja, camarões ao vapor de cerveja etc.  

— *A cerveja é provavelmente a mais antiga das bebidas alcoólicas. Na Babilônia já era consumida, há 6 mil anos. Mas foi no século XX que houve a explosão de sua produção e consumo. Em 1984, só os Estados Unidos produziam mais de 226 bilhões de litros. No mesmo ano, o Brasil ficava com mais de 28 bilhões de litros e calcula-se que a média de consumo per capita mundial esteja em torno dos 36 litros.*  

Os alemães são o povo que mais consome cerveja, seguidos dos belgas, tchecos e australianos.  

*Baixa fermentação, alta fermentação* — depois de tudo destrinchar, comparar e até explicar ("a *bitter stout*, cerveja nacional irlandesa, produzida pela Guinness, de Dublin. Aspira a ser cerveja macha, amarga (...) Bebe-se à temperatura ambiente, às vezes ligeiramente esfriada, e às vezes, mais raramente, alternada com champagne"), Antonio Houaiss aguarda os convidados para autografar o livro. *A Cerveja e Seus Mistérios*, hoje, no Paço Imperial, a partir das 18h. Serão distribuídos gratuitamente, numa cortesia da Brahma (tiragem de 5 mil exemplares).  

— *E qual a sua cerveja preferida, Antonio?*  

— *A tcheca Pilsen. Mas também gosto das alemãs em geral e tomo muito bem as brasileiras. Só não tomo mais porque minha mulher não deixa.*  


**Crédito:**  

*Foto de Carlos Ibaoguira*  

*Publicado em 11/08/1985 Jornal do Brasil 

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