Ser Botafoguense em 1987, dois anos antes da quebra do tabu de campeão carioca,
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Fonte: Jornal do Brasil, 08.11.1987. |
Uma torcida entre a esperança e a saudade
Como olhar para o futuro com os olhos do passado*
Cláudio Arreguy
Supersticioso, nostálgico, esperançoso, precipitado e místico é esse sofredor fiel que deixa o Maracanã desiludido numa quarta-feira, jurando que não voltará, e reaparece no mesmo local no Botafogo com a inconfundível camisa preta e branca e o velho grito na garganta. Um grito de memória curta, esquecimento rápido, mas de paixão eterna: “Fogo.”
Que ser botafoguense é, antes de tudo, aderir à superstição todos sabem desde os tempos de Carlito Rocha e do cãozinho Biriba. Se não, que outro motivo teria levado a diretoria, após insistentes e desesperados apelos, a voltar atrás na decisão de modificar a manga da camisa tradicional? Ela voltou a ser listada.
Ser Botafogo é insistir. E julgar sempre que os insucessos terminaram, a má fase passou e os títulos voltarão. Os títulos não voltam, mas a torcida sim. Está lá no jogo seguinte: esperançosa, como se nada de ruim houvesse acontecido. O botafoguense não dá o braço a torcer, ainda tem trunfos para jogar nas discussões de esquina.
Afinal, não era do Botafogo a base da Seleção Brasileira bicampeã mundial? Coincidência ou não, não é menos verdade que a escassez de títulos do Botafogo é contemporânea da conquista do tricampeonato no México pela Seleção Brasileira. Conquista essa que teve em Jairzinho o principal artilheiro. Jairzinho, camisa 10 do Botafogo.
As estatísticas registram que a torcida do Botafogo é menor do que as de Flamengo, Vasco e Fluminense. Mas em campo não costuma ser assim. Se o time ganha o jogo anterior, então, leva uma multidão para o Maracanã, nos clássicos de domingo. Num sábado recente, pelo menos 50 mil botafoguenses assistiram à derrota para o Flamengo. Hoje tem o Corinthians. E o Botafogo vem de grande triunfo sobre o Grêmio no Sul.
Na imprensa tal estatística não existe. Basta lembrar que quase todos os principais colunistas esportivos do Rio são botafoguenses. João Saldanha não só é torcedor como foi técnico campeão estadual de 1957 pelo Botafogo.
E o botafoguense João é um dos mais ardentes defensores da tese de que o insucesso do Botafogo se liga intimamente ao próprio período sem títulos do futebol brasileiro. Há os que extrapolam e acham que o Botafogo é o reflexo dos tempos da ditadura, a opressão do povo, a carestia.
“Ser Botafogo é como…” assim começam com frequência as análises sobre o que é ser botafoguense. Até o Corinthians (o preto e branco será coincidência?) entra nas comparações. O Corinthians ficou 23 anos sem um título. E o Botafogo vai entrar no 20º ano. Faltarão mais três?
Para o botafoguense, não. Ano que vem o jejum termina. Só que esse ano que vem nunca chega. Mas a torcida, esperançosa, não arreda. E se aglomera à primeira vitória. Se é contra o Flamengo, então…
Esta tarde, nas arquibancadas e gerais do Maracanã, a torcida do Botafogo será mais esperançosa do que nunca. Contra o Corinthians no próprio — ela vai em peso. Se precipitada ou não, só se saberá depois. Mas cada vez mais nostálgica, supersticiosa e mística. Agora, devem pensar os botafoguenses, a coisa vai. Será? Não tem tanta importância. No outro jogo a torcida está lá de novo. Gritando na mesma intensidade: “Fogo!”.
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