No dia 11 de setembro de 1973, umgolpe militar derrubou no Chile o governo do socialista Salvador Allende. Apartir desse momento, com o apoio dos EUA, caiu sobre a América Latina a noitedas ditaduras. O 11 de setembro de 2001, o ataque às Torres Gêmeas em Nova Iorque serviucomo pretexto para que o governo de George W. Bush fizesse da guerra contra oterrorismo o instrumento principal para instaurar um novo poder global. Ironiasda história, dois 11 de setembro depois, o legado de Salvador Allende na regiãoestá mais vivo do que nunca.
Luis Hernández Navarro,correspondente da CartaMaior na Cidade do México
No dia 11 de setembro de 1973 umgolpe militar derrubou no Chile o governo do socialista Salvador Allende. Apartir desse momento, com o apoio dos falcões de Washington, caiu sobre amaioria dos países da América Latina a noite sombria das ditaduras militares, arepressão e o desmantelamento das conquistas sociais. O Chile se converteu nogrande laboratório neoliberal de onde seriam exportadas suas políticas paratodo o mundo. Sacrificando Allende se quis frear as lutas de libertação nocontinente.
O 11 de setembro de 2001, oataque às Torres Gêmeas em Nova Iorque serviu como pretexto para que o governo de GeorgeW. Bush fizesse da guerra contra o terrorismo o instrumento principal parainstaurar um novo poder constituinte. No calor da tragédia, os EUA fixaram umanova doutrina de segurança nacional na qual advertiram que não tolerariamdesafios ao seu poder, defendem a ação militar solitária em defesa da unidadenacional, sustentam o direito de efetuar ataques preventivos em qualquer partedo mundo e advertem que a dissuasão contra inimigos que “odeiam os EUA e tudo oque representam” é inútil.
Os dois 11 de setembro são datasque marcam o início de ofensivas do Império para reforçar seus interesses eabrir no continente americano e no Oriente Médio um novo ciclo de dominação ede acumulação de capital. No primeiro caso, o golpe de Estado serviu para frearo avanço da esquerda e das forças nacional-populares no Cone Sul, aprofundar apenetração do capital estadunidense e ampliar a presença militar. No segundo,permitiu à Casa Branca, com o pretexto do combate ao fundamentalismo religioso,avançar no controle dos recursos petroleiros no Oriente Médio e fazer da guerraparte do ciclo de expansão e consolidação da globalização neoliberal. Seuobjetivo foi impor uma nova ordem internacional unilateral; estabelecer, pelalógica do fato consumado, um governo autoritário da globalização.
Os dois 11 de setembroreafirmaram o “excepcionalismo” estadunidense. Em 1787, James Madison,conhecido como o “pai da Constituição” dos Estados Unidos, assinalou que oobjetivo principal do governo devia ser “proteger a minoria opulenta da maioria”.Em plena Convenção Constitucional, expressou que temia que onúmero cada vez maior de habitantes que sofriam as desigualdades da sociedade“suspirasse secretamente por uma distribuição mais equitativa dos bens”. Ademocracia, sentenciou, devia ser reduzida.
Nessa época, outro dos “paisfundadores” desse país, Thomas Jefferson, afirmou: “Estou persuadido que nuncahouve nenhuma constituição tão bem calculada como a nossa para a expansãoimperial e o autogoverno.”
Quase dois séculos depois,primeiro Richard Nixon e depois George W. Bush se empenharam em tornarrealidade em escala planetária a missão que Madison atribuía ao governo e queJefferson atribuía à Constituição de seu país.
A 38 anos do primeiro 11 desetembro e dez do segundo, na América Latina os povos resistem. Derrubaram asditaduras militares da década dos anos de 1970 e meados dos de 1980 e abriram aporta para que candidatos de centro-esquerda ganhassem as eleições. Antes dotriunfo eleitoral, já se tinha produzido uma vitória cultural. O que o Impérioquis evitar com o golpe de Estado no Chile renasceu por outras vias. Asaventuras imperiais de Washington no Oriente Médio debilitaram o controle sobrea área que era considerada o quintal dos Estados Unidos.
Os governos progressistas na AméricaLatina impulsionaram um processo de reconstrução da arquitetura do poder e dageopolítica na região. Há no continente uma redefinição profunda das relações eda inserção com os Estados Unidos, que se expressa tanto no rechaço daspolíticas da Casa Branca como no surgimento de um novo tecido institucionalpara favorecer a integração regional. A Área de Livre Comércio das Américas (Alca)foi torpedeada e, no Equador, não se renovou o contrato para que os EUAutilizassem a base militar de Manta. Também na contramão de Washington, asolidariedade com Cuba e as relações diplomáticas ativas com o Irã têm sido umaconstante. O investimento chinês cresceu vertiginosamente. Com dificuldades,uma proposta pós-neoliberal abre caminho na região.
Ironias da história, dois 11 desetembro depois, o legado de Salvador Allende na região está mais vivo do quenunca.
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