A peça que se baseia na primeira grande tragédia da crônica policial de Maringá - a morte de um inocente menino de 15 anos pela PM, em 1967- faz correlações do personagem
que tornou-se santo e ao mesmo tempo a grande vitima da ditadura em seus métodos.
Clodimar é um mito popular e dele partem diversas interpretações e possibilidades. Mas a direção de Roberto Corbo e Tânia Farias consegue escapar dessas armadilhas.
O que mais se vê no palco - local maravilhosamente ocupado pelo próprio público - é o conjunto do barro, do retirante. O nordeste está ali e a família migrante de Clodimar agrupa todos sonhos e mazelas.
Corbo e Tânia tiveram o distanciamento necessário para narrar o drama Clodimar sem as habituais afetações nativas, ao mesmo tempo que nos aproxima da violência crua. Neste momento, o que ocorre com o menino é o que poderia ocorrer como qualquer um de nós.
Isso se percebe no momento em que Clodimar é torturado. Parte é mostrada como se ele estivesse num pau de arara, mas o que inquieta é justamente aquilo que não se vê.
É a cena do quarto do hotel em que não há personagens em cena, somente as vozes e os gritos da tortura. O público, sentado em circulo, se sente impotente. Cada espectador tenta ver algo de acordo com o angulo em que está sentado, mas só encontra gritos. A falta da visão aguça os ouvidos.
O espetáculo pode frustrar aqueles já acostumados a linearidade da historia do protagonista e da forma como é retratada. Digo isso pois o "Caso Lô" - como é conhecido pelo moradores mais antigos de Maringá - tem linguagem e forma muita vezes barroca.
"Clodimar" combina um texto repleto de fragmentos. Essa colcha tem retalhos muito bem escolhidos e lapidados por Carolina Santana, sobretudo os textos de Frei Betto.
Porém, seria ingenuidade entender "Clodimar" como uma peça que quer reforça uma mitologia cristã. O Cristo aqui é revolucionário e Frei Betto sempre acreditou nisso.
Depois da tortura, da morte e dos milagres atribuídos ao menino santo, o espetáculo fecha com uma festa para compartilhar o pão e o vinho junto ao publico.
Esse é o grande final. Em "Clodimar - Do Crime ao Santificado Popular", o espectador é um companheiro, aquele que com quem se compartilha o pão e o milagre da sobrevivência.
(Marcelo Bulgarelli)
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