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sábado, novembro 03, 2012

Graciliano Ramos





 Um dos principais nomes da geração modernista dos anos 30, autor
 de Vidas Secas. Graciliano Ramos (27/10/1892-20/3/1953), completaria 120 em 27 de novembro.  Natural de  Quebrângulo, foi o primogênito de quinze irmãos. Depois de concluir os estudos secundários, trabalha como jornalista e comerciante. Em 1928 é eleito prefeito de Palmeira dos Índios (AL), mas renuncia dois anos depois. Muda-se, então, para Maceió, onde exerce os cargos de diretor da Imprensa Oficial do Estado e da Instrução Pública de Alagoas. Em 1933 lança seu primeiro romance, Caetés, e mantém contato com escritores da vanguarda nordestina, como José Lins do Rego, Jorge Amado e Rachel de Queiroz. Em 1934 publica uma de suas obras-primas, São Bernardo. Acusado de subversão comunista em 1936, fica preso por 11 meses no Rio de Janeiro, cumprindo parte da pena no extinto presídio da Ilha Grande. Narra a experiência no livro Memórias do Cárcere (1955). Após ser libertado, continua a viver e a trabalhar no Rio como jornalista e inspetor de ensino. Na década de 40, já consagrado como um dos maiores romancistas brasileiros, filia-se ao Partido Comunista. Em 1952 viaja para a União Soviética e outros países socialistas do Leste Europeu, descrevendo suas impressões no livro Viagem, publicado postumamente. Com linguagem precisa e preocupação social, sua obra é um exemplo da abordagem da literatura como meio de conhecimento e mudança da realidade, típica da segunda geração modernista. Entre seus livros se destacam ainda Angústia (1936), lançado durante o período de prisão, e Vidas Secas (1938). Morre no Rio de Janeiro.


 (...) "Chegamos ao fim da escada, paramos a entrada de um porão, mas durante minutos não compreendi onde me achava. Espaço vago, de limites imprecisos, envolto em sombra leitosa. Lá fora anoitecera; ali duvidaríamos se era dia ou noite. Havia luzes toldadas por espesso nevoeiro; uma escuridão branca. Detive-me, piscando os olhos, tentando habituar a vista. Erguendo a cabeça, via-me no fundo de um poço, enxergava estrelas altas, rostos curiosos, um plano inclinado, próximo, onde se aglomeravam polícias e um negro continuava a dirigir-me a pistola. Era como se fossemos gado e nos empurrassem para dentro de um banheiro carrapaticida. Resvaláramos até ali, não podíamos recuar, obrigavam-nos ao mergulho. Simples rebanho, apenas, rebanho gafento, na opinião dos nossos proprietários, necessitando creolina. Os vaqueiros, armados e fardados, se impacientavam. Desviando-me deles, tentei sondar a bruma cheia de trevas luminosas. Idéia absurda, que ainda hoje persiste e me parece razoável: trevas luminosas. Havia muitas lâmpadas penduradas no teto baixo, ali ao alcance da mão, aparentemente, mas eram como luas de inverno, boiando na grossa neblina. Arrisquei alguns passos, maquinalmente, parei meio sufocado por um cheiro acre, forte, desagradável, começando a perceber em redor um indeciso fervilhar. Antes que isto se precisasse, confuso burburinho anunciou a multidão que ali se achava. Agora já não éramos pequeno rebanho a escorregar num declive; constituíamos boiada numerosa; à idéia do banheiro carrapaticida sucedeu a de um vasto curral. Certamente a perturbação visual durou um instante, mas ali de pé, sobraçando a valise, a abanar-me com o chapéu de palha, tentando reduzir o calor, afastar o cheiro horrível, mistura de suor e amoníaco, um pensamento me assaltou, fez-me perder a noção do tempo. Que homens eram aqueles que se arrumavam encaixados, tábuas em cima, embaixo, à frente, à retaguarda, à esquerda, à direita?" (...) RAMOS, Graciliano. Memórias do Cárcere. São Paulo, Livraria Martins Editora, 1975, 1º volume, pág. 121

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