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terça-feira, março 29, 2022

ecos da quarentena

Em frente ao meu prédio tem um senhor que me acorda aos domingos com um forró bem raiz, gostoso mesmo, sabe? Durante meses foi assim. Quando a esposa dele foi diagnosticada com câncer, a musica parou.  
. No dia que eu ouvi o forró novamente fui até a sacada e acenei pra aquele vizinho. A esposa havia melhorado. E meus domingos também. 
Percebi hoje que desde o inicio da quarentena, a vida seguia num melancólico silencio. Hoje, sem forró, tentei não me absorver com tanto noticiário, redes sociais.  E recorro ao meu direito de prisioneiro. O direito de tentar fugir.  Portanto, ouço Tom Jobim.  
O piano jobiniano e a voz de Elis ninam o apartamento. A musica me conforta, ilumina. O dia tá bonito, porém inalcançável. Percebo que a musica está deslocada do tempo. O piano insiste.
Não era esse mundo que a música concebeu. Não era esse o país imaginado por aqueles que sonham. E a gente não sabe onde colocar o riso ou a melancolia. Atores que desconhecem o roteiro  e  tão desmotivados para  buscar seus personagens.  O que salva é a trilha sonora. “Pra que esse céu, pra que esse mar, pra que?’, pergunta Elis. .
A paisagem é inútil.

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