Título Original: Brasil volta a ter enciclopédia de música
Data: 05/Dez/98
Autor: Pedro Alexandre Sanches
Editoria: Ilustrada
Volta às livrarias na próxima semana, depois de 13 anos fora de catálogo, a "Enciclopédia da Música Brasileira", única obra extensiva de referência sobre música nacional -erudita, popular e folclórica- editada no Brasil.
Lançada originalmente pela Art Editora, a enciclopédia teve uma primeira edição em 1977 e desde 1985 estava esgotada. Esta segunda edição, revista, ampliada e atualizada, sai agora em parceria da Art Editora com a Publifolha, divisão de publicações do Grupo Folha, sob patrocínio do Itaú Cultural.
"Há muito eu queria relançá-la", diz o editor da Art e da enciclopédia, Marcos Marcondes, 58. "Passei de quatro a cinco anos tentando arrumar patrocinador, mas não conseguia nada."
"Por incrível que pareça, desde que foi criada, a enciclopédia permanece a única obra de referência em música erudita, popular e folclórica do Brasil. Como temos o projeto de investir em obras brasileira de referência, resolvemos encampar esse projeto", diz o diretor da Publifolha, Ricardo Gandour.
Ele afirma que a Publifolha pretende, no próximo ano, estender a "Enciclopédia da Música Brasileira" ao formato CD-ROM.
O processo de atualização, implementado durante um ano por uma equipe de cerca de 30 pesquisadores, redatores e consultores, resultou na edição de 400 novos verbetes (leia à direita), atualizados até 20 de fevereiro deste ano. São, agora, mais de 3.500 verbetes.
A obra inclui remissões a compositores, cantores, maestros, estudiosos -com biografias, relação de obras principais, datas de nascimento e morte-, gêneros e instrumentos musicais, abrigando a história da música nacional desde o descobrimento do Brasil até 98.
O editor comemora a oportunidade de correção de erros da primeira edição. "Pudemos reparar dados errados, como algumas datas de nascimento. Erros sempre vão existir, é um processo que deve ser contínuo. Agora temos a garantia de que a enciclopédia não vai ficar tanto tempo sem atualização."
"A ampliação para a segunda edição foi bastante grande", diz Marcondes. "Foram acrescentados grandes cantores de ópera que faltavam, por exemplo. Procuramos pesquisar instrumentistas que moram no exterior, um trabalho insano. Muitos artistas não responderam a nossas tentativas de contato. Um regente importante cujo nome não vou citar ficou de fora porque não respondeu a nenhum dos dez faxes que mandamos."
Ele cita outras dificuldades: "Há músicos que simplesmente desaparecem. Não conseguimos descobrir, por exemplo, se o maestro Zacarias está vivo ou não. Ele sumiu".
Cita ainda o caso do baterista de bossa nova Milton Banana. "Nós o procuramos por sete meses para atualizar o verbete, sem sucesso. No dia em que o prazo terminou, saiu no jornal que ia fazer um show no Rio. Um pesquisador nosso foi entrevistá-lo, mas não deu para entrar. Ficou para a próxima."
Marcondes explica os critérios de seleção dos nomes a serem incluídos -que deixaram de fora vendedores hegemônicos de discos nos anos 90, como É o Tchan, Só pra Contrariar e outros.
"Trabalhamos com um consultor para cada área. São eles que fazem as listas de quem deve entrar. O Tchan pode não ter entrado porque os consultores avaliaram que o grupo não é importante."
Segundo ele, há artistas de sucesso estrondoso que não têm permanência na história, "no sentido de validade artística". "O critério de vendagem não é adotado, o que conta para a enciclopédia é a qualidade artística", diz.
Explica também a omissão das discografias de cantores e bandas, que constava -embora incompleta- da edição original.
"Incluímos CDS em catálogo de cada artista, como uma bonificação para o leitor que quiser conhecer a obra. Discografia não tivemos jeito de fazer, seria uma tortura. Teria de ser um livro à parte, quem sabe um dia isso se torne um projeto.
Obra de referência é única no país
É inacreditável que uma obra de referência praticamente única na área de música brasileira estivesse esgotada havia 13 anos -e que permanecesse, assim, desatualizada, desde então.
Talvez o estado lastimável do país no quesito cultura nesse período explique o lapso e torne irremediável tudo de acréscimo que poderia ter sido feito nesses anos todos. E a volta da "Enciclopédia da Música Popular Brasileira" é uma primeira luz no fim desse túnel.
Posto isso, é, indiscutivelmente, um produto que necessita de revisão constante e contínua -e de novas edições periódicas sempre que o acúmulo de acréscimos e correções seja significativo.
Agora, em segunda edição, ainda há reparos a fazer. O principal deles é quanto a discografias, item fundamental e até hoje indisponível de forma abrangente na biografia musical nacional.
Na primeira edição, elas eram incompletas. Agora, foram eliminadas e substituídas por mostruários de obras em catálogo em CD. Não deixa de ser um serviço ao interessado por obras em catálogo (que, diga-se, varia enormemente em período curto de tempo), mas pode induzir a equívocos -"Meus Caros Amigos", de Chico Buarque, por exemplo, é creditado como CD de 1989, omitindo-se que saiu, originalmente, em LP em 1976.
Outro resíduo da primeira edição é a conversão de nomes e sobrenomes à "língua portuguesa" -Maysa vira Maísa, Maria Bethânia vira Betânia, Luiz Melodia vira Luís, Marcos Valle vira Vale e assim por diante; mas Chico Buarque de Hollanda continua de Hollanda, Wanderléa vira Wanderléia, Margareth Menezes continua Margareth e muda para Meneses, e a coisa fica um pouco confusa.
Mas, bem, são detalhes. A música nacional volta a ter, finalmente, uma obra de consulta confiável e extensiva -coisa que qualquer país civilizado está cansado de possuir.
(PAS)
Leia alguns novos verbetes
ABREU, Fernanda - "Ex-vocalista do grupo Blitz, que encerrou as atividades em 1986, iniciou carreira solo em 1990, abandonando o pop-rock-humor do conjunto pelos gêneros funk, disco music e dance music, derivados dançantes do rhythm and blues (R&B) norte-americano (...)."
BATISTA, Amado - "Suas composições caracterizam-se por melodias simples e letras sentimentais, numa variação do rock-balada. (...) Um dos campeões de vendagem da música brasileira, em 22 anos de carreira totalizou mais de 12 milhões de cópias vendidas."
Brega - "Termo utilizado desde c. 1982 para designar: 1) coisa barata, descuidada ou malfeita; 2) de mau gosto, sinônimo de 'cafona' ou kitsch; 3) a música mais banal, óbvia, direta, sentimental e rotineira possível, que não foge ao uso sem criatividade de clichês musicais (...)."
CHICO CÉSAR - "Foi criado no sertão, ouvindo cantadores e reisados, e aos 9 anos já tinha seu primeiro conjunto, Super-Som Mirim. Trabalhando como vendedor em uma loja de discos de sua cidade, teve oportunidade de ouvir desde Teixeirinha até Rolling Stones."
CHICO SCIENCE -"Criado no bairro do Rio Doce, quando menino pescava caranguejos no mangue para vender e com o dinheiro frequentava bailes funk no fim-de-semana. (...) Em 1991, formou em Olinda (PE) a banda Chico Science Nação Zumbi (guitarra, baixo, tambores, caixa e percussão) e criou o mangue beat, mistura de maracatu, embolada, coco-de-roda, ciranda e outros ritmos tradicionais com reggae, funk, rap e rock."
GABRIEL O PENSADOR - "Filho da jornalista Belisa Ribeiro, chegou a cursar comunicação, mas abandonou a faculdade para se dedicar somente à carreira."
HARRY - "Grupo formado em 1985, em Santos (...), seguia o modelo europeu do rock experimental (como o grupo inglês Joy Division e o alemão Kraftwerk) e foi precursor, no Brasil, do tecnopop e do rock industrial (estilos que abusam de efeitos e instrumentos eletrônicos)."
LADY ZU - "Uma das representantes da moderna música negra brasileira, especialmente a disco music, foi apelidada pelo apresentador de TV Chacrinha de 'a Donna Summer brasileira'."
LENINE - "Entusiasta do rock até os 17, passou a se interessar pela MPB quando ouviu o disco 'Clube da Esquina' e assistiu a um show de Gilberto Gil."
MAGAL, Sidney - "Um dos maiores nomes da chamada 'música brega' da década de 1970, com interpretações exageradamente emocionadas, próximas da caricatura."
MAMONAS ASSASSINAS -"(...) 'Mamonas Assassinas', lançado em meados de 1995, tornou-se um dos mais vendidos de todo o pop brasileiro, com sucessos como 'Vira Vira' e 'Robocop Gay' (...). Na madrugada de 2 de março de 1996, todos os integrantes do grupo morreram quando o avião que os trazia de um show colidiu com uma montanha na região (...) da serra da Cantareira."
MONTE, Marisa - "Estudou piano na infância, aos 9 anos ganhou de aniversário uma bateria e aprendeu violão. Na adolescência, estudou canto lírico e participou de uma montagem do musical 'Rocky Horror Show'. (...) Permaneceu dez meses na Itália para estudar canto, mas desistiu do gênero lírico e passou a cantar música brasileira na noite (...)."
SKANK - "Banda formada em Belo Horizonte, uma das maiores responsáveis pelo estouro de ritmos jamaicanos (reggae, ska, boom-shak-a-laka) no Brasil, na década de 1990 (...).
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