Excelente coleção! Esta seleção é um mergulho profundo em várias correntes do horror e do suspense, abrangendo desde o gótico clássico e o horror psicológico até o erotismo febril dos anos 80. Diferente da leva anterior, que se concentrava no folk horror, esta caixa explora os monstros internos, as maldições familiares e a fragilidade da mente humana.
Vamos à análise crítica de cada um desses tesouros cinematográficos.
DISCO 1: O Legado Felino
Este disco é uma fascinante exploração de uma mesma mitologia através de lentes radicalmente diferentes: a da sugestão poética e a da explicitação erótica.
A MARCA DA PANTERA (Cat People, 1982)
Paul Schrader, um cineasta obcecado por temas de repressão sexual, culpa e transcendência violenta, não estava interessado em simplesmente refilmar o clássico de 1942. Ele pegou a premissa e a mergulhou em sua própria estética febril e neon. O resultado é uma obra-prima do horror erótico, um filme que pulsa com desejo e perigo.
Análise Crítica: Onde o original de Jacques Tourneur se construía na sombra e na sugestão, a versão de Schrader se banha em luz, cor e carne. A transformação em pantera não é mais uma metáfora sutil para a ansiedade sexual feminina, mas uma consequência literal e visceral do ato carnal. A direção de Schrader é suntuosa, transformando Nova Orleans em um pântano de sensualidade e decadência. Nastassja Kinski entrega uma performance icônica, personificando a inocência amaldiçoada, enquanto Malcolm McDowell é a pura personificação da perversão e do poder predatório. Impulsionado pela trilha sonora inesquecível de Giorgio Moroder e a canção-tema de David Bowie, "Putting Out Fire", A Marca da Pantera é um sonho febril sobre o horror de uma herança inescapável, onde o amor e a morte estão eternamente entrelaçados. É menos um filme de terror e mais uma tragédia gótica e pulsante.
A MALDIÇÃO DO SANGUE DE PANTERA (The Curse of the Cat People, 1944)
Este filme é um dos casos mais belos de subversão de expectativas da história do cinema. Pressionado pelo estúdio RKO para produzir uma sequência de terror para o sucesso Sangue de Pantera, o produtor Val Lewton entregou algo completamente diferente: um drama lírico e melancólico sobre a solidão infantil e o poder da imaginação.
Análise Crítica: O título e o marketing são um engodo proposital. Não há maldição nem horror no sentido convencional. A "ameaça" aqui é a incompreensão dos adultos e a dificuldade de uma criança sensível em se conectar com um mundo pragmático. A "amizade" de Amy com o fantasma de Irena (a sublime Simone Simon) é tratada com uma delicadeza tocante, sugerindo que Irena não é um espectro malévolo, mas uma projeção da necessidade de afeto e fantasia da menina. A estreia de Robert Wise na direção já demonstra a sensibilidade e o foco nos personagens que marcariam sua carreira. A Maldição é um filme corajoso e poético que usa o cenário do horror para contar uma história sobre luto, memória e a beleza frágil do mundo interior de uma criança. É uma obra-prima silenciosa que desafia qualquer categorização de gênero.
DISCO 2: Mentes e Membros Assombrados
Este disco explora a linha tênue entre o sobrenatural e a loucura, questionando se o horror vem de fora ou de dentro de nós.
OS DEDOS DA MORTE (The Beast with Five Fingers, 1946)
Um clássico do horror gótico da Warner Bros., este filme se apoia em uma premissa fantasticamente macabra e na performance deliciosamente exagerada do grande Peter Lorre. É um "whodunit" sobrenatural que se deleita em sua atmosfera de mistério e paranoia.
Análise Crítica: A grande força do filme de Robert Florey é sua ambiguidade. A mão decepada do pianista é genuinamente uma entidade vingativa ou tudo não passa de uma alucinação em massa, catalisada pela loucura do personagem de Lorre? O roteiro de Curt Siodmak brinca com essa dúvida até o fim. Peter Lorre rouba todas as cenas com sua interpretação de um astrólogo obcecado e aterrorizado, protagonizando uma batalha icônica contra a mão espectral. Os efeitos especiais, para a época, são notavelmente eficazes e criativos, tornando a mão um personagem crível e ameaçador. Os Dedos da Morte é um exemplar perfeito do terror de estúdio dos anos 40: atmosférico, bem-atuado e com um mistério central que mantém o espectador envolvido até sua conclusão engenhosa.
DEMÔNIOS DA MENTE (Demons of the Mind, 1972)
Uma joia da fase final e mais experimental da Hammer. Cansada de seus monstros góticos tradicionais, a produtora mergulhou em terrores mais psicológicos e viscerais. Este filme é um exemplar perfeito dessa transição, trocando vampiros por um caldeirão de neuroses freudianas, incluindo incesto, repressão e loucura hereditária.
Análise Crítica: Demônios da Mente é um filme sombrio e perturbador. A trama do barão que isola os filhos para "curá-los" da loucura da família é uma alegoria potente sobre como a repressão e o controle podem ser mais destrutivos do que a própria doença. O horror aqui não vem do sobrenatural, mas da psicologia distorcida dos personagens e da atmosfera claustrofóbica da mansão. O roteiro se aprofunda em conceitos de psicanálise e na ideia de que os "pecados dos pais" se manifestam literalmente nos filhos. Embora tenha elementos de folk horror — a desconfiança dos aldeões em relação à família reclusa na colina —, seu coração é um drama familiar gótico e doentio. É uma obra ousada e um dos filmes mais interessantes e atipicamente complexos do catálogo da Hammer.
DISCO 3: Vingança e Paranoia
Este disco final nos apresenta thrillers de vingança que operam em diferentes registros: o gótico britânico, o suspense "bergmaniano" e o terror televisivo.
EMBUSTE DIABÓLICO (Catacombs, 1965)
O primeiro trabalho de Gordon Hessler na direção é um thriller gótico britânico compacto e eficaz. O filme segue a tradição de clássicos como As Diabólicas, onde um crime aparentemente perfeito começa a se desfazer, seja pela culpa do assassino ou por uma genuína retribuição sobrenatural.
Análise Crítica: Embuste Diabólico é um exercício de suspense atmosférico. Seu terror é construído na paranoia crescente do protagonista, que não consegue escapar da memória (ou da presença) de sua esposa assassinada. Hessler demonstra um bom domínio da criação de tensão em espaços confinados, usando a mansão e suas passagens secretas para amplificar a sensação de que não há para onde fugir. Embora seja um filme de orçamento modesto, ele se beneficia de uma trama bem amarrada e da premissa clássica de que a consciência culpada é o maior dos fantasmas. É um raro e valioso exemplo do "Brit-noir" com um toque macabro.
O VISITANTE NOTURNO (The Night Visitor, 1971)
Um thriller psicológico de altíssimo calibre. A descrição "bergmaniano" é perfeita: o filme é estrelado pelos pilares do cinema de Ingmar Bergman, Max von Sydow e Liv Ullmann, e é filmado com uma austeridade e uma frieza visual tipicamente escandinavas. A premissa é brilhante e diabólica.
Análise Crítica: Este é um filme sobre inteligência e vingança. A genialidade da trama reside no plano do personagem de von Sydow: como cometer uma série de assassinatos e retornar a um manicômio de segurança máxima sem deixar vestígios, criando o álibi perfeito. A direção de László Benedek é precisa e impiedosa, construindo uma tensão quase insuportável a cada fuga noturna. Max von Sydow entrega uma performance magnética de fúria contida e brilhantismo metódico. O verdadeiro horror do filme não é o sangue, mas a inevitabilidade fria da vingança e a impotência dos culpados diante de um inimigo que eles mesmos criaram e subestimaram. É um suspense sofisticado, cerebral e absolutamente arrepiante.
Menção Honrosa: Os Demônios dos Seis Séculos (Gargoyles, 1972)
Um clássico absoluto do cinema feito para a TV dos anos 70. O que poderia ser uma simples história de monstro é elevado por um roteiro surpreendentemente inteligente e, acima de tudo, pelo design de criaturas inovador e genuinamente assustador do lendário Stan Winston. Os gárgulas não são apenas monstros; eles são uma espécie antiga e inteligente, com sua própria cultura e motivações, o que os torna muito mais interessantes. Um marco do terror televisivo.

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