Publicado na revista Claudia anos 70
Os convites continuam chegando, só que agora Cláudia pensa duas vezes antes de aceitá-los. O bem-estar, junto da família, parece-lhe mais seguro do que a fama.
— Não sou mais a mocinha inexperiente a quem faziam trabalhar sete horas por dia, a quem deixavam esperando em um canto do estúdio por um longo tempo, a quem vestiam de qualquer modo e que estava sempre disposta, sem nunca sequer levantar a voz. Agora luto, discuto, aprendi a defender-me, a fazer-me valorizar. Não me amedrontam mais, agora sou uma veterana, conheço o reverso de todas as medalhas. Conheço, sobretudo, o preço alto de ser uma diva, uma estrela popular. Cláudia está desistindo de pagar este preço.
— As deusas não existem no cinema Ocidental. Somente entre os povos ingênuos, como os da União Soviética e os da Europa Oriental, ainda sobrevive o divismo. Há alguns anos, eu poderia ter concorrido com a Loren, poderia tentar roubar à Sofia a coroa de rainha do cinema italiano. Mas agora nem sei mais se ela ainda usa esta coroa ou se ainda existem coroas deste gênero. Concorram, dizem sempre os produtores. Mas concorrer com quem? Não veem que somos sempre as mesmas há mais de dez anos. Somos sempre nós, imutáveis: Sofia, Gina, Cláudia, Virna, Monica, Silvana, Caterine, Sylva, Rossana.
Nos jornais, nossas fotos não são nem imagens de divas, são fotografias de um álbum de família. O palacete do casal Cristaldi, a 12 quilômetros de Roma, se torna cada dia mais movimentado. A proprietária gosta de estar sempre presente nos salões setecentistas ou passeando pelos enormes jardins da “vila”. Este é um prêmio que Cláudia faz questão de se conceder, daqui por diante.
— Estou trabalhando muito. Chega. Pelo menos esta frenética atividade no cinema me deu oportunidade de ganhar muito dinheiro. Já tenho o que me basta, não preciso correr atrás da segurança econômica. Devo preservar agora a segurança familiar.
Patrick sempre reclama as ausências da mãe e não entende como uma atividade “tão chata, tome um tempo grande”. Ciumento da carreira de Cláudia, Patrick está atento a qualquer modificação nos planos da família. Está sempre cobrando uma atenção devida, que, justamente por motivos profissionais, lhe foi negada nos seus oito primeiros anos de vida.
— Patrick é muito diferente de mim. Na escola tem revelado preferência pelas matérias técnicas. Disse que quando crescer vai se dedicar à química, cobrir-se de glória. Revela também um gosto acentuado pelo desenho. É um gosto maravilhoso.
Foi, no princípio, uma luta, hoje é uma profissão como outra qualquer. E nada mais.
Convidada várias vezes para filmar em Hollywood, a meta de toda atriz que deseja projeção mundial, Cláudia Cardinale, depois de três filmes norte-americanos, desistiu da experiência. Cláudia não se adaptou à rigidez do processo de trabalho e se recusou a ser um simples produto de venda, consumido pelas plateias de cinema sob a sigla CC.
— Não existe nenhuma função para mim em Hollywood. Os americanos desejam atrizes, por isso fazem listas das melhores da Europa e decidem pô-las à prova. Mas tudo com muita prudência, sem arriscar: sempre fazem os papéis secundários, simples aparições, enquanto os homens têm os melhores personagens. Colocam-nos em histórias onde predomina a presença masculina, como nos filmes de guerra, e a nós cabe apenas o papel de enfermeira, ou de espiã ou de simples camponesa. Aparecemos não mais do que quinze minutos.
O Preço da Glória
O que pode parecer desilusão profissional ou mágoa por não conseguir o sucesso de uma Sofia Loren (de história bem semelhante), na verdade é apenas a consciência de que a atriz de cinema tem direito de viver sua própria vida. Por mais burguesa que possa parecer. Mas quem desconfia dos propósitos de Cláudia — alguns chegaram a insinuar perda de prestígio — não a conhece bem. Técnicos e atores brasileiros que estiveram em contato com ela, em 1965, quando veio filmar Uma Rosa Para Todos no Rio, são unânimes em confirmar sua espontaneidade e a absoluta falta de jeito para o estrelismo. Circulando nas ruas, em pleno carnaval, se misturou àqueles que dançavam, evitando bailes fechados e festas de gala. Assim é Cláudia, de quem Alberto Moravia, famoso escritor italiano, traçou um perfil exato:
— Sua cabeça é de criança, no máximo de 15 anos. A cabeça e o corpo exprimem as coisas mais diversas: a cabeça, timidez, ingenuidade, insegurança, imaturidade, inexperiência; o olhar de menina modesta lembra o de um menino triste. O corpo, serenidade, tranquilidade, maturidade e, antes de mais nada, um apetite de vida que é puro, espontâneo e preso a implicações morais e intelectuais.
Sempre rodeada de Patrick e do marido, Cláudia tem evitado viagens frequentes ao exterior. Uma vez ao ano, pelo menos, sai da Itália para filmar nas mais estranhas latitudes. Depois de sofrer sob o calor violento da selva venezuelana quando filmava Popsy Pop, com Papillon, transferiu-se ano passado para os campos gelados da Romênia, onde, ao lado de Oliver Reed, rodou Un Uomo.
Domada — As Alegrias da Profissão de Atriz
As ambições de Claudia Cardinale nunca foram tão exageradas a ponto de desejar ser a mais importante das estrelas do cinema italiano. Por uma questão de temperamento, de formação revelada muito cedo por insistência dos próprios pais, Cláudia Cardinale nunca procurou o sucesso que, de imediato, alcançou. Inesperadamente, foi alçada em meio aos acontecimentos que a projetaram em todo o mundo. Depois do filme O Leopardo, de Visconti, seus dias de aventuras prosseguiram com Vittorio De Sica, Bolognini e Franco Cristaldi.
O filme de Visconti assinalou uma virada decisiva na sua vida. “O cinema me entedia. Apenas o trabalho me atrai”, disse.
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